Por quem os sinos dobram?
- Flávia Lima
- 1 de mar. de 2021
- 1 min de leitura
Atualizado: 5 de mar. de 2024

Os sinos da minha aldeia tocam todos os dias, anunciando as horas e as missas católicas. Mas eu inventei meu próprio motivo para as badaladas que, até então, me lembravam agonia e coisa muito velha. Desde que a pandemia começou, gosto de pensar que os sinos dobram, de fato, por ti, por mim, por todos nós, como escreveu John Donne, em 1764:
"Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti".
É isso: quando um de nós parte da Terra, um pedacinho de terra se dissolve no oceano e o continente fica menor.
Os sinos dobram pelos que se foram, deixando a Terra menor e mais triste. Dobram pelos que estão de luto e com medo de morrer. Dobram pela avó, que fez um vazio no coração da família, ao partir; pelo marido morto, que deixou o travesseiro devastado; por todas as mães perdidas. Os sinos dobram por que ficamos todos viúvos e viúvas, irremediavelmente solitários e órfãos, mesmo que a gente não saiba onde estão exatamente as 240 mil covas cavadas nessa aldeia onde os sinos choram tanto que já deixaram muitos ouvidos insensíveis.
Ilustração de @laertegenial
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